Chinha: uma vida inteira de amor e dedicação ao vôlei
Após mais de seis décadas nas quadras, o professor se despede deixando um legado de paixão, ensino e inspiração ao vôlei de Itupeva.
O nome José Geraldo Ramos de Oliveira talvez não diga tanto ao ser pronunciado, mas se ele for substituído por Chinha, é certo que qualquer pessoa que teve algum envolvimento com o vôlei de Itupeva e região nos últimos 64 anos vai reconhecer, afinal, trata-se de um dos atletas mais dedicados e de carreira mais longa que o esporte regional já viu.
Depois de uma longa jornada dedicada ao vôlei, começando com apenas 11 anos em Jundiaí, Chinha finalmente se aposentou ao completar 75 anos, para lamento de muitos dos atletas e alegria dos familiares, como do jovem neto Gustavo, que celebrou: “A gente vai poder ficar mais tempo junto, assistir mais Fórmula 1, assistir mais futebol e se ver mais nos fins de semana”.

A comemoração é válida, já que nos quase 40 anos de dedicação como professor de vôlei em Itupeva, Chinha passou muitos sábados e domingos comandando equipes em competições, desde as categorias de base até os times já adultos.
“O vôlei, para mim, representa tudo de bom que já vivi até hoje”, conta o rio-grandino (natural de Rio Grande), que nasceu em 1950 no estado do Rio Grande do Sul, mas logo se mudou para Jundiaí, onde começou sua trajetória vitoriosa aos 11 anos como levantador.
Aos 16, já comemorava seu mais marcante título, como campeão brasileiro infantil pela Seleção Paulista, em Curitiba.
“Por Jundiaí conquistei mais de 15 títulos regionais. Fui convocado para a Seleção Paulista pela primeira vez aos 15 anos, e com ela ganhei o título brasileiro em Curitiba, que me marcou muito”, relembra.
O apelido Chinha surgiu como uma brincadeira em 1965, quando tinha ainda 15 anos e desmaiou durante o aquecimento para um jogo em São Caetano do Sul (SP), após ser atingido por uma bolada de outro jogador que justamente tinha o apelido de Chinha. E o nome pegou.
Profissionalização e auge como jogador
Nos anos 70, embora seguindo apaixonado pelo vôlei, Chinha ainda não conseguia viver só do esporte e trabalhava como programador de produção.
“Naquela época ainda não tinha profissionalização, isso veio só na metade dos anos 70”, conta.
A dedicação seguiu rendendo reconhecimento e Chinha foi suplente do capitão da Seleção Brasileira, William Carvalho da Silva, um dos jogadores de maior destaque do Selecionado da época — que conquistou medalhas de prata no Mundial de 1982 e nas Olimpíadas de Los Angeles.
“Foi essa Seleção que ajudou a popularizar o esporte e considero um privilégio ter sido suplente do William, que era um dos principais jogadores e que defendeu por muitos anos nosso país”, explica.
A carreira de jogador, no entanto, não era o suficiente e o desejo de Chinha ia além. Ele queria passar a outros o que sabia. Queria ser professor.
Missão: ensinar
Chinha se formou em Educação Física em 1983, na Escola Superior de Educação Física - ESEF de Jundiaí. No ano seguinte, fez pós-graduação em voleibol, mas a vocação para professor já o havia “contaminado”.
“Eu já era técnico de categorias de base em Jundiaí, antes de me formar como professor em 1983. No ano seguinte fiz pós-graduação em voleibol e comecei a dar aula em Itupeva em 1988, quando a cidade tinha ainda cerca de 8 mil pessoas”, relembra.

Em Itupeva, ao lado da professora Adriana Arista, que ensinou e comandou as equipes femininas da Prefeitura por mais de 25 anos, Chinha foi responsável por duas gerações de atletas que aprenderam com ambos a amar o vôlei.
“A gente fez um grande trabalho em dupla, não só na base, mas também com os times de competição”, comenta, sobre a colega de profissão e amiga, que fez questão de comparecer ao evento surpresa de homenagem preparado para Chinha por sua aposentadoria.
Durante a homenagem, na companhia da esposa, dos filhos e netos, além de amigos e colegas, muitos alunos e ex-alunos marcaram presença para destacar a importância do professor. Um dos momentos mais emocionantes foi o depoimento de Marcela Berge, que foi aluna em 1990, no Colégio Leonardo da Vinci, onde Chinha também lecionou por 30 anos.
“Você me recebeu no vôlei, introduziu minha filha ao vôlei, então muito obrigada por tudo e por tanto que você fez”, declarou, emocionada.

Legado
A aposentadoria de Chinha, aos 75 anos, marcou o fim de um ciclo e o início de outro — o reconhecimento de uma vida inteira dedicada ao vôlei.
Durante quase quatro décadas, ele foi mais que um treinador: foi um formador de gerações, conhecido pela dedicação nas quadras e pelo bom humor fora delas, onde apelidar amigos virou uma de suas marcas pessoais.
“Eu fico feliz pelo que começamos no vôlei em Itupeva, que foi crescendo e hoje tem muitos atletas de várias idades. Os professores que vieram depois de mim estão seguindo esse caminho, e tenho certeza de que vão continuar o trabalho iniciado lá atrás, há quase 40 anos”, afirmou.
A carreira teve momentos inesquecíveis, que ele guarda com carinho, como na inauguração do ginásio de Amparo, quando defendeu a cidade contra o Santos em 1968. “Essa para mim foi a partida mais difícil, e eu tinha só 18 anos, então estava ainda evoluindo e com muito para aprender”, destaca.
Já como técnico, Chinha cita com carinho a partida contra Cerquilho, nos Jogos Regionais de 2018, quando os itupevenses chegaram a ficar 5 pontos atrás no segundo set, mas viraram o placar e venceram o forte adversário, formado por atletas contratados para a competição: “Foi uma vitória espetacular, com o ginásio lotado, e que deu muito orgulho para todos nós naquele momento”, recorda.
Para muitos ex-alunos, Chinha foi mais que um técnico e a homenagem destacou que “ele não apenas formou atletas, mas ajudou a moldar cidadãos, transmitindo valores que vão muito além das quadras: respeito, disciplina, amizade e superação”.
Ao encerrar sua trajetória, ele não se despede do vôlei, mas entrega às novas gerações o legado de quem viveu intensamente cada saque, ponto e vitória.
Mais do que um professor, Chinha é parte viva da história do vôlei — e o que ele ensinou segue inspirando novos atletas a acreditarem no poder transformador do esporte.
“Tudo que fiz pelo vôlei foi por amor ao esporte e à profissão”, conclui.

